quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

O Suficiente

O senso de medida e a noção de proporção vêm sendo banidos pela conspiração de excessos de todos os gêneros. Exageros de consumo, de lazer; de palavras, de atos; excessos de escândalos de todos os tipos.  Nada parece bastar, nada chega ao suficiente, que poderia dar o alento da satisfação ou de mínima tranqüilidade.
Sobressaltados por constantes e imprevisíveis variações de maré, vamos tocando a vida aos solavancos. Por momentos, inebriados com a ilusão de felicidade vendida pelas propagandas de sorridentes celebridades.  Na fase do compra-compra, devoramos a vida sofregamente, gastamos o que ainda não temos, embevecidos com o crédito fácil do viva hoje e pague a perder de suas vistas. Quando vira a maré chegam as duras penas da imprevidência e o caro preço das fantasias de consumo, que custam os olhos da cara. E porque a vida vem sendo tocada assim, refém dos apelos de consumo, a maioria das pessoas está hoje à deriva, refém da atual crise. Pouca, pouquíssima gente tem reservas financeiras ou mesmo de crédito para se amparar por algum período, ainda que seja o curso de apenas alguns dias. A lufa-lufa do salve-se quem puder está instaurada e a agonia por sobrevivência está espalhada por todos os cantos. Por ora, é preciso socorrer a quem mais precise, ajudar a quem possamos, mas além disto, parece importante fazer do presente caos uma oportunidade de reflexão e aprendizado.
Um ponto pacífico e, penso eu, de consenso: não dá para confiar em políticos e suas políticas. Eles nos apresentam o paraíso apenas nas milionárias campanhas. Eleitos, tiram o manto da bondade e se revestem de incompetência, tirania e arrogância. Renovar o plantel político com gente de melhor quilate é possível, mas vai demandar tempo. A revolução que podemos produzir, de modo mais seguro e imediato, é a revolução interna, pessoal.
 Precisamos balizar esse mar de insolvência para vencer a deriva, governada pelo capricho dos ventos e das tempestades. Sair do círculo vicioso das necessidades inventadas para o círculo virtuoso de uma vida auto-sustentável é um caminho seguro e possível. Para isso não é preciso recorrer à complexa orientação de caros especialistas e nem fazer um curso on-line, apenas pensar, refletir e decidir orientar a própria existência para uma vida mais simples.

 Podemos viver com menos e ser mais felizes assim. Para isso, não há receitas mágicas, mas critérios básicos a serem definidos de acordo com a característica de cada pessoa. Essa é a base da corrente de pensamento crítico e consumo consciente chamada de suficientismo, defendida por pessoas que cansaram de comprar o que não precisavam com o dinheiro que não possuíam. A atitude de buscar e viver apenas com o suficiente rompe com os costumes vigentes e livra a existência dos grilhões das idéias de êxito, sucesso, luxo, popularidade e outras tantas frivolidades. A vida fica mais leve, tranqüila e, por conseqüência, feliz.  Dispensadas todas as ansiedades desnecessárias, vivendo apenas com o suficiente conseguimos saborear cada hora e cada dia como quem sorve a taça de preciosa bebida. Afinal, a gente leva da vida a vida que a gente leva, como canta Leila Pinheiro, e para isso o suficiente é o bastante, nada aquém e nada além disto.
             (Publicado no Jornal Agora  - em 05/09/2015)

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