quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

A Vitória dos Gabolas

O Livro das Caras (Facebook) parece estar produzindo exacerbação da autoestima, perda da autocritica e outras tantas coisas.Com a facilidade de postar coisas, todo mundo – literalmente – expõe sua vida e extravasa a própria intimidade. Uns com algum pudor ou cuidado, mas a maioria de forma absolutamente irrestrita. A mudança social produzida em larga escala e em tempo recorde fez surgir diversos fenômenos, mudou a escala de valores morais e criou novos personagens.
Nos tempos anteriores à época virtual – um tempo não tão distante – gente que se exibia, exibidos, contadores de vantagem, faroleiros, eram chamados de gabolas. Chamar alguém de gabola era ofensa, ainda não tinham inventado o bullying. E vale lembrar que os gabolas de então se exibiam de formas muito discretas considerando os atuais padrões.
Fotografar a si mesmo, fazer um autorretrato, por exemplo, exigia, além do caro filme na câmera, certa habilidade e equipamento adequado. Era precisocolocar um tripé num lugar seguro. Ajustar o ângulo, montar a cena, reservar seu lugar e depois acionar o cronômetro de disparo, correndo para a frente da máquina e entrar na cena, com cara de espanto. A maioria dessas fotografias era de grupos, nas quais o fotografo queria apenas fazer parte.  O resultado – a foto – era mostrada para um pequeno grupo de pessoas interessadas. Agora com a proliferação de câmeras digitais e celulares que tiram fotos, fotografar se tornou algo banal, dispensando custos, cuidados, conhecimento e bom gosto.  Surgiu o fenômeno Selfie, autorretrato tirado normalmente apenas do rosto, com a dimensão dada pelo braço. Considerada palavra do ano em 2013, quando até poderosos presidentes se prestaram para fazer selfies, desprezando as excelentes fotos tiradas por dezenas ou centenas de fotógrafos profissionais.  Para piorar, alguns tiram seus selfies nos ambientes e momentos menos apropriados, demonstrando o quanto está sendo o perdido o senso de medida e a sensibilidade estética.
Os selfies são apenas uma das demonstrações do quanto esta é a vez dos Gabolas, de gente que se exibe a qualquer preço. Independentemente de seu valor ou importância, parece que muita gente está se achando “grande coisa”.
Se os selfies são o retrato deste tempo de gabolice, a moda ostentação – em todas suas formas – se ajusta sob medida a tudo isto. O que há pouco tempo era considerado exagero, breguice, agora está no hit da moda. Os mais pobres (de espírito ou de dinheiro), se exibem com pesadas correntes de ouro (verdadeiras ou falsas), muitos anéis, tatuagens, piercings e outros penduricalhos. Os mais endinheirados – ou endinheiradas, não se incomodam de gastar fortunas em exóticas grifes da moda, usando estilos chamativos, que os diferenciem claramente e mostrem o quanto “estão podendo”.  Todo mundo parece quererse exibir, expor sua figura.

Como o contágio social nunca foi tão poderoso, quanto mais exibida e exótica for uma criatura, mais seguidores alcançará – proliferando verdadeiros exércitos de Maria Vai com as Outras. Estas, porém, são um capítulo à parte, que merece muitos parágrafos e extrapola este artigo, que apenas quer reconhecer a vitória – talvez a vingança – dos gabolas.
                                         (publicado Jornal Agora em 11/07/2014)

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