quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Antes que Acabe

Conheço um razoável quinhão da natureza exuberante de nosso país, que tão poucos brasileiros conhecem. Fui descobrindo aos poucos, ao longo do tempo, seguindo oportunidades que o generoso destino me ofereceu. Assim conheci encantada a Amazônia, as grutas de Bonito - MS, os Lençóis Maranhenses - MA, único deserto com água doce do mundo. No acervo de minhas memórias estão a praia de Jericoacoara – CE, quando recém chegara a luz elétrica e ainda se parecia a um vilarejo de pescadores; a magnitude das Cataratas de Iguaçu; o litoral paradisíaco do nordeste e outros muitos lugares. Em nenhum, porém, vivi uma experiência tão impactante quanto a que vivenciei na até então para mim desconhecida Pirenópolis - GO, a qual fui levada para fazer um curso, em tempos pré-internet.
No único intervalo dos trabalhos, fui de bicicleta visitar as cachoeiras próximas ao hotel. Era um parque ao qual cheguei após 10 minutos de trajeto em estrada de areia e pedras, entre subidas e descidas. O funcionário que me recebeu ofereceu um folheto guia, deu breves informações e disse que eu não encontraria ninguém na mata naquele horário, o que me deixou uma sombra de apreensão. Tão logo adentrei a trilha, porém, fui sendo possuída por um sentimento de intensa alegria, de uma felicidade profunda que invadia minha alma e parecia entrar pelos poros. A felicidade era tanta, tão grande e forte que comecei a rir sozinha. Num primeiro momento fiquei até desconfiada de mim mesma. Estaria enlouquecendo? Que sensação era aquela? Estava vivendo uma fase de percalços antes da viagem, o que tornava ainda mais esquisita tão súbita felicidade. Não usava drogas, não tinha tomado remédio algum e me sentia assim, de repente, tão feliz a ponto de rir sozinha. A estranheza, porém, foi deixada de lado tão logo alcancei a primeira da série de sete cachoeiras. Era a menor, mas o contato com as águas geladas e cristalinas retirou como que por milagre a dor que sentia nas pernas, fruto do esforço de bicicleta. A partir dali, segui descobrindo cada uma das cachoeiras ao longo do caminho, até alcançar a última, a mais alta. Ela surgia em uma clareira e a água caia como se viesse do céu. O sentimento de felicidade foi ainda mais absoluto, pleno e transcendente. Sentia a presença superior, Divina, em tudo que me envolvia naquele momento e precisei agradecer. Senti necessidade de agradecer do fundo da minha alma por estar ali, por toda a Natureza perfeita que estava a minha volta.
Após viver esse momento de júbilo absoluto, em que parecia que o próprio tempo havia parado, retornei radiante. Reencontrei na descida os colegas de curso, quando ainda iniciavam a caminhada. Resolvi refazer o caminho, tão feliz e energizada que estava. Agora, porém, a experiência foi outra. O burburinho das vozes, dos risos, das conversas, pareceu espantar a magia que antes existia. A mim restava apenas comparar as duas experiências, confirmando que algo extraordinário acontecera comigo. Ao retornar da viagem e contar minha vivência, uma amiga me falou que eu tivera uma experiência mística com os seres elementais, os espíritos da natureza. Que a alegria que eu sentira era porque esses seres invisíveis – que eram como crianças - me haviam envolvido. Por mais cética que eu fosse, não havia como não acreditar, tendo vivido o que eu vivera.

 E porque passei a acreditar nos espíritos da Natureza, tenho hoje a alma triste pela catástrofe provocada na região do Rio Doce, mas não quero falar dessa tristeza. Desejo que leiam esta crônica como uma exaltação às maiores riquezas do Brasil e como um convite a que conheçam as maravilhas naturais de nosso país, antes que acabem, destruídas pelo turismo predatório, pela ganância e pela insensatez humanas.
                   (publicada no Jornal Agora - em 28/11/2015)

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