quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

A Culpa é dos Neurônios Espelho

   Há não muito tempo, por obra de acaso em meio a um estudo, neurocientistas da Universidade de Parma (Itália) descobriram os neurônios-espelho.   O sistema desses neurônios é ativado pelo simples fato de se ver determinada ação, reagindo e acionando a área cerebral correspondente, como se estivesse fazendo a mesma coisa.  Estudados pelos mais modernos métodos de mapeamento cerebral, hoje se sabe que há neurônios espelho em várias áreas do córtex e que eles estão envolvidos em atividades importantes como o desenvolvimento da linguagem, a compreensão dos gestos lingüísticos e a compreensão da intenção da ação que visualizam.  Juntamente com outros grupos de neurônios, eles são responsáveis pela empatia, que é a capacidade de conseguir entender e sentir emocionalmente o sentimento de outra pessoa. Altruísmo, generosidade, solidariedade e outras nobres ações humanas dependem dessa capacidade de empatia, que se há uns falta, afortunadamente, outros tem de sobra.
Patologias graves, como psicoses e autismo, estão associadas a falhas severas no sistema dos neurônios espelho levando a profundas dificuldades de compreender emocionalmente a ação das outras pessoas. Há pessoas, entretanto, nas quais a falha do sistema não chega a nível psicótico, mas provoca dificuldades no convívio interpessoal por sua frieza emocional ou indiferença moral. É o caso dos golpistas que conseguem com naturalidade envolver e ludibriar outras pessoas por não sentirem mal estar pelos danos que estão provocando. Mas também é o caso de pessoas que apenas não conseguem entender sentimentos alheios: os imprudentes verbais, as pessoas inconvenientes, egoístas, egocêntricas e outros tipos humanos que por aí circulam sem carimbo de patologia, mas provocando danos a uns e outros.  Culpa da falha de seus neurônios.
Saindo da patologia e adentrando ao social no qual estamos todos inseridos, a neurociência poderia oferecer revolucionárias alternativas à sociedade. Sabendo-se, como hoje se sabe, como o cérebro é capaz de reagir e repetir a ação do outro, espelhando-a, não seria o caso de se repensar a forma como se aglutinam as pessoas?
Se juntarmos pessoas de má índole com gente ainda pior, o que poderemos esperar? Obviamente, a maldade se potencializará pelo convívio com pessoas semelhantes. Exemplo disso é o modelo medieval de genérico encarceramento de criminosos que fracassa na função corretiva e mais ainda no objetivo pedagógico. É um resultado óbvio diante de um sistema estruturado em avesso ao bom funcionamento da mente e do comportamento humano. Não dá bons resultados e nem poderia se esperar que desse.

Pela forma como funciona nossa mente e pelas conseqüências sociais da ação dos neurônios espelho, também não deveria causar espanto que as pessoas se tornem tão iguais quando afinem o convívio, como acontece tanto com presidiários como com nossos políticos. Eleitos para nos representarem, deixam de espelhar nossos anseios tão logo mergulham nas confortáveis águas do poder. Literalmente exilados da vida cotidiana normal, inseridos em ambientes “diferenciados”, laureados por privilégios de todos os gêneros, as “excelências” adquirem não apenas novos trajes, mas novos modos de ser e de pensar. É a ação dos neurônios espelho, reagindo apenas ao que aos olhos vêem e não enxergando o que o coração não sente. Gentileza gera gentileza; esperteza gera esperteza... Culpa dos neurônios espelho.
                           (publicada Jornal Agora - em 25/07/2015)

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