quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Carta ao Papai Noel

Você deve estar estranhando minha carta, tão acostumado que está a receber as mensagens de gente miúda. Pois decidi vencer a inibição diante das tristes atuais circunstâncias. A coisa por aqui, no universo das pessoas grandes, anda bem cruel, meu bom velhinho. Por isso, após acender velas para todos os santos, pensei que não deveria desperdiçar a oportunidade de lhe fazer um pedido.
Antes preciso confessar que há tempos deixei de acreditar na sua pessoa e até mesmo andei censurando a excessiva importância dada a sua figura. O nascimento de Jesus me parecia o suficiente para fazer do Natal uma data significante.
Apesar de minha descrença e dos conceitos que continuo tendo, resolvi registrar meu pedido. Na verdade, nada pedirei especificamente para mim. Com o avanço dos anos e do branco de meus cabelos, necessito de cada vez menos coisas. As materialidades da vida perderam o poder de me encantar. Hoje o que preciso e mais desejo não se empacota, não se precisa carregar e nem pode ser pago em moeda de qualquer espécie. Por não se poder comprar e nem pagar, bem sei, é um pedido complicado de ser atendido. É que estou cansada de tantos desmandos, dos desatinos generalizados; farta dos bilhões desviados por todos os lados, dos escândalos diários, das maldades escabrosas. Por isso venho lhe pedir um presente coletivo.
Sei que não posso pedir para que faça acabar a fome ou a miséria no mundo. Se desse, eu até pediria, mas não me convém exagerar. Também não valeria pedir o derradeiro final das guerras, outro presente que eu gostaria muito de ganhar, mas seria abusar demais de sua boa vontade. Porém, quem sabe, o senhor poderia fazer um esforço, convocar o aniversariante Jesus e, numa grande força tarefa, realizar algum de meus preciosos sonhos de Natal. Algo do tipo: aproveitar o brilho natalino e lançar um tantinho de luz sobre as tantas mentes entorpecidas pela vaidade, pela ganância, pelo egoísmo. Ou iluminasse a consciências desses muitos que nos estão a roubar, para que voltassem a sentir vergonha, arrependimento e desejassem devolver o que não lhes pertence. Isso seria um presentão.
Quem sabe fosse possível, nem que só por um dia, promover o verdadeiro sentimento de solidariedade entre todas as pessoas, acima de toda e qualquer diferença. Ou então, como numa epidemia de febre súbita, todos se sentissem impelidos a praticarem o bem, a serem mais generosos, compreensivos, tolerantes. Só por um dia, um diazinho apenas, um surto de bondade inundaria todos os quadrantes do planeta. Por escassas 24 horas surgiria uma onda de fraterno amor e genuíno entendimento entre as pessoas. Haveria uma trégua nas maldades, nas miudezas cotidianas. Ou, num pedido mais modesto, que apenas se desse uma pausa nos afazeres, nos compromissos e nos passatempos e se priorizasse o que realmente é importante. Que as pessoas se olhassem e se ouvissem mutuamente.

Por fim, Papai Noel, se não der para trazer nenhum desses presentes, pelo menos lhe peço que nos poupe das amarguras da vida, ao menos por um dia. Já será um doce presente, que com esperança desde já lhe agradeço. 
                        (publicada Jornal Agora - 13/12/2014)

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